Alexandra Carla Prazeres de Azevedo
E-mail: xanda_cruz@yahoo.com.br
Palavras-chave: Jornal. Prática pedagógica.
A escolha do tema deve-se ao fato que ele é pouco discutido na literatura e no âmbito acadêmico. É um assunto que tem granjeado uma maior visibilidade e importância. Diante dessas limitações, percebi a real necessidade de me debruçar em leituras sobre o assunto. Com as leituras, novos horizontes se abriram, novos questionamentos, como: Qual o meio pedagógico mais apropriado para ser utilizado pelos professores? Qual a importância da produção e do uso do jornal na sala de aula? O que pode ser feito objetivando o melhor ganho no sentido de ensino-aprendizagem para os alunos?
Várias e profundas são as transformação que a nossa sociedade passou e ainda passa, seja no âmbito social, econômico, político ou cultural. Como a educação não poderia ficar alheia a essas transformações, a escola se coloca diante de novas tarefas, não porque seja a única instância responsável pela educação, mas por ser a instituição que desenvolve uma prática educativa de forma contínua na vida das pessoas.
Diante de tantas transformações, surge uma nova concepção de educação, concepção esta que perpassa também as práticas educativas dos docentes. É neste contexto que estão inseridos os vários meios didáticos, que têm como objetivo apoiar a prática pedagógica, e o jornal é um deles.
Apesar de o jornal ser um diferencial na prática pedagógica do professor, e atender a uma das orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), ele ainda não é um meio didático muito utilizado nas escolas.
Segundo os PCNs (BRASIL, 1997), as matérias abordadas no jornal podem servir de base para o desenvolvimento dos temas transversais, temas estes que são notícias em outras mídias, em outros meios de comunicação, como por exemplo, questões relacionadas a valores, a preconceitos de raça, credo e etnia, dentre outros.
Faria (2002) traz uma importante colocação quanto à utilização de jornal pelos alunos.
- É o mediador entre a escola e o mundo; ajuda a relacionar seus conhecimentos prévios e sua experiência pessoal de vida com as notícias, leva-os a formar novos conceitos e a adquirir novos conhecimentos a partir de sua leitura, ensina-os a aprender a pensar de modo crítico sobre o que lê, estabelece novos objetivos de leitura (p.12).
Acrescento a esta citação, que a sua utilização amplia o vocabulário, permite a troca de idéias e possibilita que os alunos percebam a estreita ligação entre as teorias estudadas na escola e as notícias jornalísticas.
A relação entre leitura e escrita, é outro eixo fundamental. Quanto mais variados e interessantes forem os textos jornalísticos, maior será a chance dos alunos se tornarem leitores hábeis, isso porque textos diversificados despertam a atenção e o interesse dos alunos pela leitura. Ler e escrever são atividades que se complementam. Quando o aluno lê bem (e compreende o que lê), tem mais chances de escrever bem, já que a leitura fornece a matéria-prima para a escrita.
Segundo Eveline Charmeux (1995, p. 38), a leitura diversificada tornou-se hoje, uma ferramenta indispensável à vida em sociedade. Pesquisas importantes realizadas sobre as causas do fracasso escolar mostraram como causa maior desse fracasso é o não-domínio da leitura. Muitos alunos deixam a escola porque não conseguem responder às exigências de lectoescrita (habilidade adquirida de poder ler e escrever) da sociedade do conhecimento. Falta hoje nos alunos o domínio da leitura compreensiva, isto é, ler e entender o que lê.
Segundo Martins (2005) a concepção de leitura gerada no meio escolar também contribui para o fracasso escolar. A escola tem concebido a leitura como um simples ato de ler, isto é, de decodificar o sistema lingüístico, de treinar o aluno a representar graficamente a fala pela combinação das letras do alfabeto. Os professores voltam-se exclusivamente para o domínio de gramática e escrita ortográfica, mas a leitura na verdade é muito mais que isso. A escola precisa desenvolver nos alunos as habilidades lingüísticas necessárias para a interação e integração do aluno na sociedade letrada (ler, escrever, falar, escutar e entender). Falar e escutar, além de ler e escrever, são ações que permitem produzir e compreender textos.
Hoje, vivemos bombardeados por um grande volume de informações esparsas, e que nos chegam através da mídia (Faria, 2002, p.13), impregnadas de ideologias, e concepções taxadas como verdades absolutas. Agnes e Savino (apud Faria, 2002) falam que
- [...] a mídia e suas produções impregnam o quotidiano. Elas influenciam nossa percepção do espaço e do tempo, os dados de nosso conhecimento e nossa visão de mundo. Elas modificam nossa relação com o real. Este envolvimento influencia as reflexões e os comportamentos, os modos de pensar e a aquisição de conhecimentos (p. 13).
Diante dessas informações, para que os alunos questionem e se posicionem de forma favorável ou desfavorável, caberá ao professor orientar o aluno a selecionar fatos, organizando-os, analisando-os e criticando-os. O perfil de cidadão que o mundo contemporâneo deseja, é um cidadão informado, ativo, crítico, que não seja “míope” diante da realidade. Segundo Martins (2005), a nossa escola está na contramão dos ideais da sociedade letrada. É uma exigência da sociedade pós-industrial a leitura compreensiva, fundamental para o desenvolvimento humano dos jovens, seu exercício de cidadania e sua qualificação para o mundo do trabalho. O mundo da leitura requer das pessoas um olhar crítico e argumentativo sobre os grandes temas da vida em sociedade. Para Paulo Freire (1997, p. 22), o ato de educar é um ato político, e por isso é impossível separar a educação da política e do poder; o bom educador é aquele que não é neutro diante das situações ocorridas na sociedade, ele deve ter um caráter incentivador, que aguça o indivíduo a ser crítico, capaz de expor suas opiniões, de fazer mobilizações em busca de seus ideais.
Mas, para os alunos se apropriarem dos jornais e tomarem para si a necessidade e a vontade de aprender, vários paradigmas precisam ser desmistificados, um deles é a idéia de que jornal é para adulto. Dentro dos mais variados gêneros (artigos, reportagens, crônicas, entrevistas, tiras, charges, notícias, etc.) com certeza eles encontrarão algo que lhes chame atenção. Outro paradigma é que o manuseio do jornal deve ser feito por crianças que tenha condições de ler e compreender os textos dos jornais. O uso jornal pelas crianças pode começar antes mesmo da alfabetização, elas podem conhecer e/ou reconhecer as letras, podem formar sílabas ou palavras, com o tempo ela vai ter maior intimidade com os mesmos. Ainda há outro paradigma de que somente a escola tem a responsabilidade de garantir condições para que a disposição do aluno para a aprendizagem se manifeste e prevaleça. Estudos importantes revelaram que o ambiente em que a criança vive influencia muito a sua concepção quanto ao uso do jornal; se ela vive em uma família em que a leitura informativa é apreciada e utilizada, a criança se sentirá motivada a fazer o mesmo. Portanto, a parceria entre família e escola deve ser estabelecida, pois não cabe somente a escola esse papel, a família precisa começar desde cedo a estimular o uso da leitura informativa nos seus filhos.
Apesar de haver um incentivo por parte do Governo que se faça presente o uso do jornal na sala de aula, é válido considerar que nenhuma ação governamental é tomada para que isso aconteça de forma efetiva. Essas idéias são lançadas para que as escolas as concretizem, mas não se dá as mínimas condições necessárias para que isso aconteça. A começar pela formação dos professores que é precária e incipiente, e o acervo teórico que é escasso e pouco abrangente, insuficiente para dar sustentação à prática docente. Para Faria (2002), o jornal é um excelente material pedagógico (para todas as áreas), sempre atualizado e desafia os professores a encontrar o melhor caminho didático para usar esse material na sala de aula. Ainda para ela, um dos principais papéis do professor seria o de estabelecer laços entre a escola e a sociedade, pois levar jornais/revistas para a sala de aula é trazer o mundo para dentro da escola. (p. 11, 12). Compartilha dessa mesma opinião Nóbrega (2006, apud BENCINI, 2006, p. 36), quando ela diz que: “há uma distância enorme entre o que acontece dentro e fora da escola. A exploração do texto jornalístico contribui para aproximar essas realidades”.
Um outro ponto a ser refletido, e que não podemos perder de vista é que o jornal não é o único meio de interação entre o aluno e a sua realidade social. Os PCNs incentivam também a utilização de outros impressos.
- Todo material é fonte de informação, mas nenhum deve ser utilizado com exclusividade. É importante haver diversidade de materiais para que os conteúdos possam ser tratados da maneira mais ampla possível. (...) A utilização de materiais diversificados como jornais, revistas, folhetos, propagandas, computadores, calculadoras, filmes, faz o aluno sentir-se inserido no mundo à sua volta" (BRASIL, PCNs, v. 1, p. 104).
Várias são as possibilidades de o professor trabalhar na sala de aula com os jornais; uma delas é permitir que o aluno manuseie todo o jornal, que selecione notícias para serem lidas na sala, organizando assim um mural com as reportagens daquela semana, que fomente discussões sobre a diagramação do jornal, como por exemplo, porque aquela reportagem está no espaço maior, a outra no espaço menor etc, que se discuta a comparação feita da mesma notícia com outros meios de comunicação, a fim de possibilitar uma compreensão da diferença, do enfoque, da abrangência dada a cada matéria (o ideal é que o aluno tenha contato com exemplares de mais de um jornal., pois essa diversidade permite a análise de diferentes pontos de vista dos autores), que se produza jornal na sala de aula.
Pocho (2003, p. 43) define o jornal escolar como um periódico impresso feito pelos alunos desde a elaboração da pauta até a impressão, ele atua como um instrumento pedagógico mediante o qual os alunos poderão levar suas experiências e preocupações para dentro da escola.
A produção no jornal na sala de aula pode favorecer o desenvolvimento de responsabilidade, cooperação, trabalho em equipe, uma vez que diferentes grupos de alunos devem ser responsáveis pelas diversas etapas do processo (planejamento, reportagem, redação, impressão, divulgação e distribuição), incentiva os alunos a escrever, melhorando com isso sua escrita e contribui para o desenvolvimento da criticidade dos alunos. Os alunos, ao verem a sua produção, se sentirão motivados a estarem produzindo cada vez mais o jornal.
Enfim, o jornal pode ser um diferencial no processo de ensino-aprendizagem, mas isso vai depender de como se dá a sua utilização na sala de aula. Se o professor for utilizar o jornal para o aluno identificar adjetivo, substantivo, etc.... então a sua utilização se torna falida, pois apesar de utilizar um outro meio pedagógico, a sua metodologia continuará a mesma, não mudará em nada.
Diante de tudo que foi exposto, apesar do jornal ser um ótimo meio pedagógico, ele está longe de ser a receita única, absoluta que vai servir a todos, nas diversas situações. As possibilidades de utilização dos mais variados recursos didáticos são múltiplas e diferenciadas. Cabe, portanto, ao professor selecionar o melhor material disponível e ajustá-lo ao contexto no qual estão inseridos.
REFERÊNCIAS:
BENCINI, Roberta. Todas as leituras. In: A revista do professor Nova Escola, São Paulo, v. 1, n.194, p. 30-39, agosto 2006.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Introdução aos parâmetros curriculares nacionais. (v. 1). Brasília: MEC/SEF, 1997.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa. (v. 2). Brasília: MEC/SEF, 1997.
CHARMEUX, Eveline. Aprender a ler: vencendo o fracasso. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 1995.
FARIA, Maria Alice de Oliveira. Como usar o jornal na sala de aula. 7ª ed. São Paulo: Contexto, 2002.
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 35. ed. São Paulo: Cortez, 1997.
MARTINS, Vicente Os excluídos do mundo da leitura. Por Disponível em: http://www.partes.com.br/ed50/educacao.asp. Acesso no dia 20/06/08.
POCHO, Cláudia Lopes. Tecnologia educacional: descubra suas possibilidades na sala de aula. Petrópolis, RJ: vozes, 2003